Abro os olhos com o mesmo sentimento angustiante de sempre: hoje vai ser mais um dia inútil. E não têm todos eles sido assim? Desde que me lembro, sim.
Houve uma época, que parece-me agora ter sido eras atrás, em que escrever era natural como respirar. Meus dedos dançavam com naturalidade sobre o teclado do meu velho notebook e as palavras brotavam na tela, entravam na dança, dançavam conforme a música e compunham uma harmonia textual que me fazia duvidar ser eu a pessoa que as escreveu.
Escrever era estar viva.
É isso.
Mas a vida me atropelou. Com seu caos corriqueiro, ela trouxe obrigações, prazos, limitações para minha criatividade e o que antes era prazer, agora era obrigação e obrigadas a sair, as palavras se recusavam a vir para mim. Estavam de mal comigo.
Olho para a tela a minha frente. O cursor pisca como quem debocha da minha incapacidade de fazer algo tão simples como escrever um texto que me parecia estar perfeitamente completo na minha cabeça. As contas se acumulando não são motivação suficiente para eu escrever, cumprir meu contrato, entregar o livro, ganhar meu dinheiro. Dinheiro não é motivação suficiente para eu escrever.
Uma completa inútil; é o que sou. Uma autora sem obras. Que piada.
Uma gargalhada sinistra germina em minha garganta, vai surgindo primeiro miúda, broto de loucura, e cresce, cresce... um estouro de botões de riso desvairado, rindo da situação, da incapacidade, da vida. É a vida!
Então o riso para e eu sei. Estou fazendo errado. Quero seguir o protocolo perfeito que tracei na minha mente, mas não é isso que as palavras querem. Elas são orgânicas e querem contar sua própria história. E de repente, eu lembro a música e meus dedos começam a dançar enquanto surge uma história que ninguém imaginou.
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